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quarta-feira, 5 de maio de 2010

O GENERAL E O FILHO DO COMUNISTA

Como todo jovem, sempre sonhei em ter uma vida melhor. Residindo em Teófilo Otoni, minha terra natal, não encontrava uma maneira de acertar meus caminhos. Aquela situação da prisão do meu pai pela ditadura militar estava influindo negativamente na minha vida, e eu tinha mais era vontade de sumir daquela região.
Não que eu não gostasse da minha terra natal, e sim devido a tantas atribulações que surgiram na vida da minha família quando das prisões do meu pai pelo regime militar. A todo momento eu tinha que dar explicações às pessoas sobre como estava meu pai, nossa vida. Eu tinha ido para a Marinha Brasileira e não deu certo. No Tiro de Guerra(Exército) de Teófilo Otoni, tomei foi soco no rosto. Santa paciência...
Arrumei as malas e disse para minha mãe que iria tentar a vida no Rio de Janeiro. Ficaria na casa dos parentes dela, ou seja, na casa de um General do Exército, Manoel Mendes Pereira, Ex. comandante da sexta Região Militar do Exército na Bahia. E tudo isso sem avisar ao General. Foi de surpresa.
Cheguei ao Rio de Janeiro e fui direto para lá. Dei o maior susto no General que, ao abrir a porta do apartamento, viu aquele jovem cabeludo com "mala e cuia", dizendo a ele que tinha vindo para ficar. Hoje, Fico imaginando a loucura de juventude que fiz e até poderia ter complicado a vida do homem e a minha, se os seus amigos militares soubessem que ele estava hospedando o filho de um preso político.
Mas, eu estava lá em carne e osso. O General não teve outra saída a não ser me convidar para entrar. Nem bem me acomodei, e ele começou a fazer um vasto interrogatório sobre mim, meu pai, minha família e o que eu estava procurado pelas bandas do Rio de Janeiro.
Parece que, por mais que eu dissesse a ele que tinha ido para estudar e trabalhar, ele não acreditava e falava ara mim que era melhor eu falar a verdade. Queria saber se eu era militante de algum movimento estudantil, organização clandestina. Foi indo até que concordou que eu ficasse no seu apartamento, arrumando um quarto para mim.
Aquele General foi criado junto com meu avô, Teófilo Rocha, e era padrinho de batismo da minha mãe. Parece-me que, mesmo não aprovando as idéias socialistas do meu pai, ele-"em consideração à minha mãe e nós filhos- andou pedindo para que não matassem o meu pai."
Na mesma semana, levou-me para tirar carteira de identidade, e nunca me esqueci desse dia. Fomos num carro modelo Dodge Landau com placa oficial do Ministério do Exército. Eu, filho de um preso político, e o General sentados no banco de trás.
Na frente, dirigindo o carro, um sério e obediente sargento do Exército. Tenho a impressão de que esta foi a primeira vez, na história do Exército Brasileiro e da ditadura militar, que um carro oficial(com todas as pompas, regalias, luxo e conforto pecualiares) transportou o filho de um preso político. Era muita perplexidade para mim, o filho de um preso político do interior de Minas Gerais, andar pelas ruas do Rio de Janeiro naquelas condições.
Lamentável foi que, durante o trajeto entre a Rua das Laranjeiras e o Instituto Félix Pacheco, ele me fez uma proposta da qual nunca me esqueci, e que me deixou numa situação de conflito interior. Ele me propôs que eu mudasse o meu nome, ou seja, tirasse o Garrocho do meu nome. Ponderei com ele que não, eu gostava(e gosto) do meu pai e tinha orgulho do meu sobrenome Garrocho.
Então, ali mesmo dentro daquele carro, ele me disse, com certo nervosismo, que enquanto eles(os militares) estivessem no poder, eu meu pai, minha mãe e meus irmãos não conseguiríamos nada no Brasil. Perguntei ao mesmo o porquê, e ele respondeu que meu pai era um homem fichado até na CIA dos Estados Unidos.
Evidente que não mudei meu nome e, durante os anos da ditadura militar, sofremos todo tipo de discriminação, acompanhando sempre nosso pai Tim Garrocho e sendo os filhos da resistência.



Autor: Téo Garrocho* Texto do livro "Retalhos da Tortura", do autor. Páginas 117, 118, 119. Livro editado em 2006.

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