ADS 468x60

quinta-feira, 27 de maio de 2010

UM PEDAÇO DE CARNE E UMA NACA DE FUMO

Lôra, a prostituta politizada, gostava de passear no mercado municipal de Teófilo Otoni. Àquela época o mercado tinha um movimento e um barulho de fazer inveja ao mais comportado inferno.Tinha de tudo para vender dentro e do lado de fora espalhados pelas calçadas. Frutas, pássaros, carnes vendidas e embrulhadas em jornal, etc. Os urubús "ficavam de ôlho" nos ossos e carniça espalhados às margens do Rio Todos os Santos. Bêbados à vontade, caminhões com bancos na carroceria para trazer e levar os roceiros, vendedores de "chupa-lili"( Um suco congelado em saquinhos), cambistas, meninos pegadores de frete, carrinhos de madeira para levar frete, carroceiros e uma cachorrada de dar mêdo.
A feira era tão grande que começava na Rua Engenheiro Argôlo e terminava na porta da aristocrata
sede do Automóvel Clube onde reunia-se a elite de Teófilo Otoni. Mais tarde, um padeiro nêgro de nome Trazíbulo(Toco) fundou o clube Sete de Setembro ou Caninha Verde para as pessoas mais pobres e humildes da cidade.
A prostituta Lôra encantava o mercado com seus açougueiros oriundos em grande parte do Estado da Bahia, os vendedores de linguiça, os raizeiros e os vendedores de fumo de rolo. Vez ou outra, Lôra sentava no colo de um açougueiro ou vendedor de fumo que embalados pelos sonhos eróticos, davam-lhe um pedaço de carne ou uma naca de fumo bom dos Vales do Mucuri e Jequitinhonha.
Ainda no mercado municipal, Dona Chiquinha, beata antiga e devota fervorosa da Virgem Maria, tinha o costume de benzer-se três vezes e beijar um escapulário do menino Jesus de Praga quando avistava a prostituta Lôra saltitante e alegre dentro daquela minúscula saia vestimenta de sedução.



Autor: Téo Garrocho- Barbacena-MG-27/05/2010

quarta-feira, 26 de maio de 2010

O TREM DA ALEGRIA

O título acima, infelizmente, nos dias de hoje, é atribuido ao comboio de políticos corruptos que se esbaldam nas benesses falcatruosas do erário público, amparados pelos privilégios da imunidade. Esmiuçando informações e inspiração para meus textos, devorei toda literatura sobre ferrovias que encontrei pela frente e percebi como são semelhantes suas histórias. Como a magia e o fascínio das ferrovias sobre as pessoas, em qualquer que seja a região, são extremamente parecidas. No caderno de reportagens do jornal Hoje em dia de 18/04/1999, identifiquei no texto do repórter João Gabriel esta semelhança, onde ele narra a passagem do trem de ferro da Central do Brasil no Campo das Vertentes, em território mineiro, e aqui adapto com as mesmas características à Bahia-Minas.
"Voltando no tempo, com o trem de ferro que vai, dê asas à recordação. E olhe que não precisa ter muita idade para um retorno na história, nem que seja aquela contada pelo pai ou avô. É uma memoria viva. Caso você não ouviu contar nada do trem de ferro, leia agora: aos domingos, bem no interior, quantas pessoas se divertiam vendo o trem chegar à estação. Se vinha alguma autoridade trazendo benefícios para a cidade ou com promessas deles, a bandinha tocava dobrados. Nem bem a Maria fumaça parava de fumar e soltar baforadas, os foguetes espocavam no ar.
E quando vinha a caravana com o comboio da amizade? Os filhos da terra vinham para uma visita. Geralmente dia do aniversário da cidade. Quanta festa! Nas estações de Carlos Chagas, Ladainha, Novo Cruzeiro, Araçuaí, o passageiro podia descer do trem, escolher broas, biscoitos e pães, leite quente com farinha de milho, doces e queijos sobre as mesas na plataforma. Não havia cobrador. Cada um pagava aquilo que comia. Tempo Bom!
Como era movimentada uma estação, onde começaram vários namoros que levavam ao casamento. São apenas fatos isolados porque em cada um dos municípios cortados pela estrada de ferro uma história peculiar, prédios suntuosos e bem construidos". Essa era a magia da Estrada de Ferro Bahia-Minas, que encantava a todos que dela se recorda. Esse era o verdadeiro trem da alegria.



Autor: Jaime Gomes. *Poeta e Escritor, natural de Ladainha-MG. Texto do Livro "Um trem passou em minha vida", do autor, Páginas 69, 70. Livro editado no ano de 2006- Gráfica Expresso de Teófilo Otoni-MG

terça-feira, 18 de maio de 2010

OS HOMENS DA BEIRA DA LINHA

Antigamente ali era conhecido por Beira da Linha, porque os trens da Estrada de Ferro Bahia-Minas passavam por ali. Hoje é a Rua Engenheiro Argolo. Ali nasceu meu pai. Ali, junto à Rua do Arrasta-Couro e o Barro Branco, praticamente, vivi grande parte da minha infância e juventude nas casas de minha avó Inês e minhas tias Dilma e Wilma. Ali conheci muitos homens inteligentes e conversei com muitos deles. Um deles era Nestor Medina.
Assim como meu pai, Nestor Medina era um ex-ferroviário e tinha um pequeno comércio naquela região. Pai de muitos filhos, se não me engano eram nove. Também como meu pai, Nestor Medina foi perseguido e preso pela ditadura militar. Perguntado por um oficial do exército se ele era o chefe do Grupo dos Onze em Teófilo Otoni, ele-com sua forte personalidade-respondeu:"Sou, sou chefe de onze: eu, minha mulher e meus nove filhos".
Nunca me esqueço do Nestor Medina e do seu comércio na antiga beira da linha, próximo ao salão de barbearia do João Fonseca. Eu cortei muito cabelo ali, no estilo"Principe Danilo". Sentado naquelas velhas cadeiras, escutava os rumores do povo e as idéias socialistas do Nestor Medina, do meu pai Tim Garrocho e de vários amigos que ali faziam parada para um "dedinho de prosa", a exemplo de Alfredinho Ferroviário, meu tio Amadeu Onofre, Seo Arruda e muitos outros. Ali próximo, consegui com João Batista Míglio (Batistinha) o meu primeiro livro considerado subversivo naquela época, "O Mundo da Paz", de Jorge Amado.
Na época da ditadura militar, mesmo com a repressão agindo, os homens da beira da linha sempre estavam em grupo, debatendo a situação do Brasil e tentando, de alguma forma, desestabilizar o regime militar.
A verdadeira história de Teófilo Otoni haverá de reservar um lugar especial para esses valorosos homens como Nestor Medina e muitos ferroviários que, em pequenas células da Política Operária (POLOP), com reuniões no antigo Hotel dos Ferroviários( de RobertoInácio), situado na antiga Rua do Arrasta Couro, realizaram movimentos que abalaram as elites da época.



Autor: Téo Garrocho- *Texto do livro "Retalhos da Tortura", do autor. Páginas 105 e 106. Livro editado em 2006.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

COMPANHEIROS E COMPANHEIRAS

Eu estava lá. Década de 1970. Sim, eu estava lá em carne e osso. Lembro que tomei uma cachaça boa do Nordeste de Minas Gerais. Precisava esquentar para enfrentar e me defender dos bajuladores da ditadura militar e sua polícia de torturadores.
Levei um cartaz com os seguintes dizeres: "Abaixo a ditadura. liberdade para os presos políticos e volta dos exilados." E ali fiquei exibindo aquele protesto solitário. O povo, tão decantado pelos amantes da liberdade, veio chegando meio temeroso. Uma dezena, uma centena, três centenas. É assim que começa um movimento de conscientização de massas oprimidas. Quando as elites e os conservadores acordam, a praça que sempre foi do povo está tomada e vozes cantando um único refrão: " O povo unido jamais será vencido".
Ganhei aplausos pelo cartaz, ganhei aplausos pela mensagem. Afinal, ditadura e tortura não combinava com minha pátria e liberdade tinha que vir ainda que tardia. Liberdade para pensar, liberdade para cantar, liberdade para votar.
Os anos passaram. Outro dia, encontrei-me com um velho e calado amigo que à época parecia não "gostar das minhas idéias de liberdade". Disse-me ele: "Téo, eu queria ser como você àquela época. Mas, eu tinha medo e até achava que você era doido. Hoje mudei minha opinião e você estava certo companheiro. Ditadura e tortura nunca mais."
E assim, eu, meus companheiros e companheiras, passamos grande parte da nossa juventude pregando nas praças, nos campos, nas escolas, nas igrejas, nas construções, a resistência à ditadura militar e lutando pela volta do Estado de Direito Democrático na nossa pátria Brasil.


Autor: Téo Garrocho. Barbacena-MG, 12/05/2010

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Téo Garrocho

Téo Garrocho junto ao painel de Fernando Sabino, em Belo Horizonte - MG

AS ESTRELAS BRILHAM

Numa das fases mais difíceis da minha vida, onde eu já não conseguia forças para caminhar, onde já não tinha esperanças no futuro, onde já não acreditava nos seres humanos, recebi uma pequena carta da minha primeira namorada, uma corajosa garota que participou da minha vida de revoltas e incertezas oriundas da ditadura militar no Brasil. Uma corajosa garota que me suportou pacientemente com palavras de conforto. O conteúdo da carta era:


Teófilo Otoni, 25 de Dezembro de 1975

" Téo, a despeito de quaisquer consequências, prossiga! continue! Não pare! Viva! Mas se parar...não pense no que passou...nos desencontros. Não pare! Se parar, olhe um pouquinho para o céu... as estrelas ainda existem, e você verá que elas brilham. Sabe Téo, as estrelas brilham. Enquanto elas brilharem, haverá esperança na vida. São símbolos de pureza inatingível que os homens ainda não conseguiram poluir.
Eu acredito em você. Eu gostaria que você pensasse nisso. Eu acredito ainda nas suas futuras conquistas. Acredito mesmo. Na conquista que você fará para uma situação decente para as criaturas em seu redor. Na conquista de você mesmo.
Pense em mim, pense em Deus. E olhe, de vez em quando, as estrelas..."



Autor: Téo Garrocho. Texto do livro "Retalhos da Tortura" do autor, página 125. Livro editado em 2006.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

DEPOIMENTOS DE LÕRA

"Meu filho foi assassinado com seis tiros e ninguém ficou sabendo quem matou meu filho. O assassino estava numa motocicleta e com capacete. Meu filho foi metralhado em plena via pública. Meu filho tinha 16 anos e sinto que perdi um pedaço de mim. Fiquei mais revoltada quando escutei alguém dizer:"Mataram mais um marginal."Acho que se fosse filho de um "Grandão" dessa sociedade podre, eles já teriam descoberto quem matou. Aqui no Brasil, o dinheiro vale muito mais.
Veja este vestido preto com bolinhas amarelas. Eu ganhei e usei no dia em que enterrei meu filho tão jovem. Este vestido é bonito, mas, me deixa triste pelas lembranças do meu filho. Toda vez que eu bebo cachaça, eu fico olhando para o vestido. Brinco, passando as mãos esqueléticas pelas flores amarelas do vestido. Vou, na minha louca imaginação, juntando flor por flor e faço um "buquê".
"Saio do meu corpo" físico e encontro espiritualmente com meu filho que recebe o "buquê" de flores com um sorriso. E assim vou vivendo. Sinto saudades da roça. Sinto saudades daquele tempo em que eu subia nos pés de goiaba e ali ficava pensando. Comia a goiaba com bicho e tudo. Hoje descobri que aquele bicho não me fazia mal. O bicho hoje é o mundo em que vivo." Se eu ficar o bicho come, se eu correr o bicho pega."
Na roça, no Vale do Jequitinhonha, eu tinha o dia ensolarado e as noites estreladas, igual pipoca na panela. Aqui eu nunca mais olhei para as estrelas que, na minha imaginação, parecem ter viajado para outros corações menos sofrido que o meu. Toda vez que eu fico sentada na soleira do meu barraco, dá uma saudade muito grande dos banhos no Rio Jequitinhonha. Eu tremia e minhas mãos se uniam como se eu estivesse rezando.
Hoje minhas mãos tremem devido ao alcoolismo e nem rezando elas param de tremer. Vou ao buteco. Bebo e as mãos param de tremer. Deve ser o primeiro trago de bebida que jogo para o "santo". Aprendi isso aqui na cidade grande. Olho para o dono do buteco e ele sorri. Penso que ele é o "santo" que faz minhas mãos pararem de tremer. Coisa de doida, sei lá."



Autor: Téo Garrocho. * Texto do futuro livro: " Lôra, a prostituta politizada dos vales do Mucuri e Jequitinhonha" do autor.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

O GENERAL E O FILHO DO COMUNISTA

Como todo jovem, sempre sonhei em ter uma vida melhor. Residindo em Teófilo Otoni, minha terra natal, não encontrava uma maneira de acertar meus caminhos. Aquela situação da prisão do meu pai pela ditadura militar estava influindo negativamente na minha vida, e eu tinha mais era vontade de sumir daquela região.
Não que eu não gostasse da minha terra natal, e sim devido a tantas atribulações que surgiram na vida da minha família quando das prisões do meu pai pelo regime militar. A todo momento eu tinha que dar explicações às pessoas sobre como estava meu pai, nossa vida. Eu tinha ido para a Marinha Brasileira e não deu certo. No Tiro de Guerra(Exército) de Teófilo Otoni, tomei foi soco no rosto. Santa paciência...
Arrumei as malas e disse para minha mãe que iria tentar a vida no Rio de Janeiro. Ficaria na casa dos parentes dela, ou seja, na casa de um General do Exército, Manoel Mendes Pereira, Ex. comandante da sexta Região Militar do Exército na Bahia. E tudo isso sem avisar ao General. Foi de surpresa.
Cheguei ao Rio de Janeiro e fui direto para lá. Dei o maior susto no General que, ao abrir a porta do apartamento, viu aquele jovem cabeludo com "mala e cuia", dizendo a ele que tinha vindo para ficar. Hoje, Fico imaginando a loucura de juventude que fiz e até poderia ter complicado a vida do homem e a minha, se os seus amigos militares soubessem que ele estava hospedando o filho de um preso político.
Mas, eu estava lá em carne e osso. O General não teve outra saída a não ser me convidar para entrar. Nem bem me acomodei, e ele começou a fazer um vasto interrogatório sobre mim, meu pai, minha família e o que eu estava procurado pelas bandas do Rio de Janeiro.
Parece que, por mais que eu dissesse a ele que tinha ido para estudar e trabalhar, ele não acreditava e falava ara mim que era melhor eu falar a verdade. Queria saber se eu era militante de algum movimento estudantil, organização clandestina. Foi indo até que concordou que eu ficasse no seu apartamento, arrumando um quarto para mim.
Aquele General foi criado junto com meu avô, Teófilo Rocha, e era padrinho de batismo da minha mãe. Parece-me que, mesmo não aprovando as idéias socialistas do meu pai, ele-"em consideração à minha mãe e nós filhos- andou pedindo para que não matassem o meu pai."
Na mesma semana, levou-me para tirar carteira de identidade, e nunca me esqueci desse dia. Fomos num carro modelo Dodge Landau com placa oficial do Ministério do Exército. Eu, filho de um preso político, e o General sentados no banco de trás.
Na frente, dirigindo o carro, um sério e obediente sargento do Exército. Tenho a impressão de que esta foi a primeira vez, na história do Exército Brasileiro e da ditadura militar, que um carro oficial(com todas as pompas, regalias, luxo e conforto pecualiares) transportou o filho de um preso político. Era muita perplexidade para mim, o filho de um preso político do interior de Minas Gerais, andar pelas ruas do Rio de Janeiro naquelas condições.
Lamentável foi que, durante o trajeto entre a Rua das Laranjeiras e o Instituto Félix Pacheco, ele me fez uma proposta da qual nunca me esqueci, e que me deixou numa situação de conflito interior. Ele me propôs que eu mudasse o meu nome, ou seja, tirasse o Garrocho do meu nome. Ponderei com ele que não, eu gostava(e gosto) do meu pai e tinha orgulho do meu sobrenome Garrocho.
Então, ali mesmo dentro daquele carro, ele me disse, com certo nervosismo, que enquanto eles(os militares) estivessem no poder, eu meu pai, minha mãe e meus irmãos não conseguiríamos nada no Brasil. Perguntei ao mesmo o porquê, e ele respondeu que meu pai era um homem fichado até na CIA dos Estados Unidos.
Evidente que não mudei meu nome e, durante os anos da ditadura militar, sofremos todo tipo de discriminação, acompanhando sempre nosso pai Tim Garrocho e sendo os filhos da resistência.



Autor: Téo Garrocho* Texto do livro "Retalhos da Tortura", do autor. Páginas 117, 118, 119. Livro editado em 2006.

terça-feira, 4 de maio de 2010

O BRILHO DAS PEDRAS NAS MÃOS DE GARIMPEIROS, LAPIDÁRIOS E CAMBALACHEIROS

Na Praça Tiradentes, além do bicho-preguiça, do saboroso e tradicional sorvete da "Sorveteria Central", do Coreto e da Fonte Luminosa, outro aspecto que também sobressai da paisagem deste espaço público é a presença de vendedores ambulantes de pedras preciosas e semi-preciosas, também chamados de cambalacheiros, pois comercializam pequenos lotes de pedras protegidas com uma camada de algodão, em papel cartolina, ao mostrarem suas mercadorias aos visitantes da cidade, estes se extasiam diante das raras gemas coloridas e lapidadas, extraídas da região de Teófilo Otoni. O encanto destas gemas só é possível, graças à atividade do lapidário, esse extraordinário artista que "desnuda" a gema para que se mostre por completo, dando brilho e fascínio às pedras que a natureza produz, retiradas do solo após extasiante atividade dos nossos garimpeiros.
Dada a importância desta atividade, 05 de junho é considerado o "Dia Municipal do Lapidário e do Cambalacheiro: Corretor de Pedras Preciosas e Semi-Preciosas" conforme Lei Municipal de número 5.409, de 03 de maio de 2005, assim como o dia 21 de julho é o Dia Municipal do Garimpeiro, instituído pela Lei número 3.868, de 02 de maio de 1995.



Autora: Neusa Ferreira Sena-*Membro da Academia de Letras de Teófilo Otoni-MG- Texto extraído da Revista Café- com- Letras. Revista Literária da Academia de Letras de Teófilo Otoni-MG, página 53- Ano 7-Setembro de 2009.