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quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

MINHA MÃE

Minha mãe nunca chorou,
Na vida só trabalhou; dez
Filhos para sustentar, não
Tinha tempo para chorar; até
Jesus chorou, minha mãe nunca
Chorou; se chorou foi bem
Escondido, tinha medo de
Apresentar fraqueza; tinha
Medo de não demonstrar
Força; tinha medo de ter
Medo; enfrentou fuzís, peitou
A ditadura, procurou meu
Pai pelos quarteis e não se
Amendrontou diante de
Generais; meu pai chorou, várias
Vezes vi meu pai chorar; não
Escondia seu olhar de boi
A caminho do matadouro; era
Fraco e desprotegido e o
Elo dele era a Conceição, o
Alicerce, a bravura, o coração;
Anônima, presente, consciente,
De todos nós a corrente; sangue
De leoa, leoparda, de fera do
Sertão; não conheço um erro
Dela ou uma insegura decisão;
Minha mãe é a coragem da
Mulher mineira; a morte a
Respeita e a vida lhe estendeu
Uma bandeira; minha mãe nunca
Chorou, juro, nem de brincadeira.



Autor: Ivanovitch Medina, irmão do médico Jorge Amado Medina. Filhos do ex. ferroviário e ex. preso político Nestor Medina. Texto publicado na Revista Café-com-Letras. Revista Literária da Academia de Letras de Teófilo Otoni. Ano 8-Número 08- Outubro de 2010, página 36.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

A FERIDA DOI NO NATAL

Há muitos anos não visito minha terra natal Teófilo Otoni. Há muitos anos tenho andado pelo Brasil e assim fui perdendo contato com minhas raízes. Houve até uma entrega de diploma como membro da Academia de Letras de Teófilo Otoni e infelizmente não compareci. Coisas do meu coração, "terra" onde raríssimos vão...
Algumas recordações surgem vagamente na minha tão confusa mente. Lembro da minha primeira namorada, a rua em que ela morava, os encontros escondidos, o primeiro beijo roubado. Lembro também da parte central e ruas próximas como a rua das flores, a rua da matriz e só. Passando próximo ao antigo casarão dos meus avós Ioiô e inez, tinha a beira da linha que ficava ao lado da antiga rua do arrasta couro onde joguei minhas saudosas "peladas" de futebol.
Ainda na minha infância aprendi muitas coisas boas com meus pais. Confesso que conservo até hoje princípios de caridade, fraternidade, amor, solidariedade para com os mais sofridos e muitos outros. Mais tarde, já na minha juventude, parece que caiu um terremoto na minha minha família e foi destruindo "meu castelo de sonhos". A quem me conhece e conhece a história do meu pai, nem preciso explicar.
Na minha vida confusa procurei explicações pela minha depressão e oscilação de comportamento. Alguns pedem para que eu esqueça, outros mais aguerridos na fé dizem que depressão é coisa do malígno, do rabudo ou capeta para os seguidores da igreja de Roma. Até mesmo o psiquiatra que penso ser "doido" fica mais "doido" com meus questionamentos aqui em Barbacena.
O psiquiatra aconselhou-me a continuar escrevendo. Ele acha que assim eu desabafo e a ferida fica "mais suave", "menos dolorida". Acho que ele tem razão. Ultimamente tenho sentido-me mais leve quando escrevo. Espero estar contribuindo com pessoas amantes da leitura, mesmo reconhecendo a simplicidade dos meus escritos.
Estou escrevendo este texto na véspera do natal. Uma data que a minha ferida doi muito devido aos meus questionamentos sobre o meu passado e o que de fato representa natal na vida das pessoas. Apesar dos questionamentos, sinto ainda uma grande luz que se inclina até nós e clareia-nos na procura de um mundo melhor. Segundo Roberto Carlos, em uma de suas músicas: "Esta luz só pode ser Jesus...". Então, ainda que a ferida doa, feliz natal a todos!


Autor:Walter Teófilo Rocha Garrocho(Téo Garrocho)- Texto dedicado aos simples de coração. Barbacena-MG, em 22/12/2010

domingo, 19 de dezembro de 2010

RUA DA BOSTA EM FILADÉLFIA

A rua estreita era conhecida como rua da bosta. Não havia por parte da administração pública nenhum interesse em beneficiar seus moradores. Segundo os mais antigos, todo aquele descaso era oriundo da ferrenha oposição que Simplício Jatobá fazia a muito tempo ao governo municipal comandado pelo coronel Serapião.
O coronel Serapião era mestre em agradar. Presentinho daqui, presentinho dali e o povo ia se acostumando com os agrados que visavam o eterno controle social e político da distante e pacata Filadélfia no Vale do Mucuri.
Diziam as más linguas, tipo Simplício Jatobá, que o coronel Serapião tinha o costume de dizer ao velho deputado majoritário: " O povo daqui, deputado, é igual animal. Todo dia você vai cevando com uma cuia de milho e ele fica cativo".
Assim, o velho coronel, de cuia em cuia tomava conta da pequena Filadélfia e seus problemas que nunca tinham solução. Tapinha nas costas daqui, tapinha nas costas dali e era visível a estagnação em todos os sentidos. O único problema era o Simplício Jatobá e suas idéias malucas, segundo o coronel.
Pois bem, Simplício foi à capital. Conheceu novas pessoas, travou conhecimentos e voltou decidido. Criaria uma associação com respaldo popular e lutaria pelos direitos da rua da bosta e sua pequena Filadéfia. O coronel e seus seguidores se assustaram...
" De grão em em grão a galinha enche o papo" e assim Simplício Jatobá foi semeando a semente da esperança e libertação do povo da cidade. Dizem que a pequena Filadélfia já conseguiu até uma universidade federal. Coisas da organização do povo.


Autor: Walter Teófilo Rocha Garrocho(Téo Garrocho). Texto dedicado à minha amiga e antiga professora Maria José Haueisen Freire, prefeita de Teófilo Otoni(MG).Barbacena, 19/12/2010.

OS OLHOS NÃO MENTEM

Maquiavel dizia que: "Mais vale ser temido que ser amado." Assim, fico a meditar nos inúmeros babaôvos e borrabotas que conheci. Foram tantos que perdi a conta e a maioria caiu no esquecimento.
Conheci babaôvo que se fosse preciso limparia com muito prazer a bunda de muito presidente(?) da ditadura militar no Brasil e guardaria como relíquia as guimbas dos cigarros luxuosos de Figueiredo. Aquela antiga classe de bajuladores era "temida" pelo povo. Por qualquer motivo eles entregavam os trabalhadores e trabalhadoras que pensavam diferente do regime de opressão pós 1964 no Brasil.
Em Teófilo Otoni, cheguei a conhecer alguns que "batiam ponto" na praça Tiradentes, ávidos para jogar nos porões da ditadura quem pensava diferente ou acreditasse que a liberdade viria, ainda que tardia.
Ao contrário dos "temidos de Maquiavel", tinhamos mulheres e homens amados. Pelos olhos conhecemos os dígnos do amor e da justiça. Os olhos não mentem... Os olhos nos permitem luz, seja divina ou material.
Quando lembro de tortura e torturadores, lembro também que alguém já disse: " É preciso ver com os olhos da alma". Os torturadores não viam com os olhos da alma e torturavam os que tinham luz e viam com os olhos da alma. Resumindo, ditadores e torturadores nunca mais.


Autor: Walter Teófilo Rocha Garrocho(Téo Garrocho). Texto dedicado ao grande homem Nestor Medina, ex. preso político de Teófilo Otoni(MG) . Barbacena, 19/12/2010.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

ME LIGARAM DO COMPLEXO DO ALEMÃO

Em prantos, Bené, antigo militante do partidão, telefona-me do Complexo do Alemão no Rio de Janeiro. "Prenderam o Zuza, prenderam meu filho". Arfando e completamente confuso, Bené temia pelo pior. Acostumado a enfrentar torturadores, Bené sentia que seu filho não suportaria os socos e pontapés da nova democracia brasileira pós anos de ditadura. Gato escaldado tem medo de água fria...
Segundo Bené, Zuza seria enviado para Catanduva ou Mossoró. Segundo ele, Porto Velho seria o inferno. Muito longe, muito mato, grandes rios, índios e por ai vai. Na imaginação do velho Bené, um quadro perfeito para possível desova. A guerrilha do Araguaia ainda estava presente na sua memória..
Tentei, com minha aparente mansidão de terceira idade, acalmá-lo com citações bíblicas. Polêmico, Bené logo questionou se eu havia me convertido. Parece até que escutei-o falando baixinho pelos cotovelos: " A religião é o ópio do povo". Sim, Bené falou como há 40 anos atrás sentado comigo em barzinho de Teófilo Otoni, comendo uns torresmos e bebendo uma velha cachaça mineira. Bené sempre enaltecia os feitos de um grande lider chinês.
Convertido ou não, disse ao Bené que precisamos "amar a Deus sobre todas as coisas e ao nosso próximo com a nós mesmos". Bené deu um grito e um tapa no telefone. Minha orelha envermelhou com os gritos: "Traíra, traíra, traíra".
Grande Bené. Sempre foi pirracento e tinha idéia fixa. Confesso que durante muito tempo pensei que Bené era louco. Fiquei imaginando ele enrolando as pontas do bigode a murmurando: "A luta continua, a luta continua..."
Como não tenho bigode, não tenho idéia fixa e não sou louco( será?) enrolo um baseado preparado com fumo bom lá de Araçuaí e entre uma baforada e outra fico a pensar: "Amarás a Deus sobre Pré-Sal, sobre Trem Bala, sobre Copa do Mundo, sobre Olimpíadas e darás ao teu próximo educação, saúde, cidadania. Assim, grande Bené, o peixe será menos amargo...



Autor: Walter Teófilo Rocha Garrocho(Téo Garrocho)- Texto escrito em 8/12/2010 em Barbacena-MG. Texto dedicado ao Professor universitário Rossandro Ramos e a todos os moradores do Complexo do Alemão no Rio de Janeiro.