Na modesta Vila Verônica de Teófilo Otoni, que meu pai tinha o costume de dizer "ser um bairro diferente pelo fato de ali partir toda resistência à opressão dos mais pobres", havia naquela época uma escola para seminaristas. Vinham jovens de várias regiões para estudar e se tornarem padres.
O seminário ficava perto do nosso velho casarão e hoje é residência do conhecido Padre Giovani Lisa. O Padre Otaviano Magalhães dirigia esse seminário e era muito amigo do meu pai e nossa família. Eu costumava jogar futebol para o time dos seminaristas, a pedido do Padre Otaviano. A minha turma da Vila Verônica não gostava quando eu jogava para os "capões", apelido dado aos jovens seminaristas. Segundo Padre Otaviano Magalhães," eu valia por dois dos jogadores dele". Muitas lembranças daquele padre me vêm à mente e, sabendo que vários segmentos da Igreja Católica apoiaram o golpe e o regime militar, as ações de Padre Otaviano Magalhães muito me impressionavam e surpreendiam a todos nós.
Como amigo do nosso pai e da família, ele sabia de todos os movimentos do meu pai. Mesmo nos momentos em que meu pai era muito procurado pelos órgãos de repressão, ele sabia onde o mesmo estava, mas não o entregou aos seus perseguidores. Preferiu calar-se e, no fundo, talvez quisesse até participar junto com meu pai daquelas lutas sociais que tinham um único objetivo: defender os interesses dos mais fracos e oprimidos, dos sem vez e sem voz da região de Teófilo Otoni e Nordeste mineiro. No fundo, ele sabia que a luta do meu pai era válida para que tivéssemos uma pátria mais justa, mais humana, mais fraterna.
Altas horas da madrugada, ele batia à porta do nosso velho casarão e falava com nossa mãe que era preciso tirar as crianças naquele momento. Até parece que ele já sabia do perigo que todos nós corríamos à véspera do golpe militar e, muitas vezes nas madrugadas frias, eu e meus irmãos saíamos quase debaixo da velha batina do Padre Otaviano Magalhães, e íamos dormir no seminário para nos esconder da Ditadura Militar.
Autor: Walter Teófilo Rocha Garrocho(Téo Garrocho). Texto do livro Retalhos da Tortura, do autor, páginas 53,54 e editado em 2006.
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