Recebi carta de Ariovaldo. Somos amigos há muito tempo. Ariovaldo é mais velho que eu. Ele tem o apelido de brabo. Seu pai chamava-se Vicencio e sua mãe Altina. Ariovaldo ou brabo nasceu na mesma rua, que eu, da pequena Vila Verônica. Tudo era muito simples. Não tínhamos telefone, televisão e nem brinquedos. Nós mesmos criávamos nossos brinquedos. O rádio e a vitrola de disco de vinil eram objetos de luxo.
Vez ou outra, a gente ia ao cinema que se chamava Império ou popularmente também chamado de "poeira" pelos mais antigos .Depois do cinema, a gente passava no bar do seo Arruda ali na beira da linha e tomava café com leite.
Ariovaldo tinha um cabelo comprido, segundo ele a a bíblia, a força do homem estava no cabelo. Assim Sansão tinha no cabelo a sua força para vencer os inimigos. Dizem que brabo se tornou valente após deixar o cabelo crescer. Brabo era e é torcedor do Flamengo. Gostava de subir na lage para soltar rojão nas vitórias do seu time.
Ariovaldo relata em sua carta que ainda não tem computador. Reclama que estudou pouco, tendo em vista que precisava trabalhar para ajudar os pais. Terminou só o antigo curso primário. Tentou curso antigo de datilografia e desistiu. Diz que lê pouco e pede perdão pela caligrafia ruim. Sua carta é bem simples,como ele e a maioria dos trabalhadores brasileiros.
Ariovaldo reclama na missiva que anda muito só.Vive de recordações do passado e ninguém o visita ou lhe conhece nas ruas. Ele era o "rei do pedaço" e não se conforma com o ostracismo em que se encontra. Ele diz que se fechou e manda uma banana para o mundo.
Ariovaldo ainda não aposentou devido atraso com a previdência Social. Ele diz que teve patrão que não recolheu o FGTS e ele a "ver navios". "Fazer o que? a corda só quebra para o lado do mais fraco", relata com ar de revolta. Ariovaldo era militante. Um aguerrido ativista social e na carta diz que "tá com muita raiva do PT, Zé Dirceu, Delúbio e Zé Genoino. "Traidores do telhado de vidro", esbraveja brabo.
Ariovaldo questiona que ando sumido.Segundo ele, o povo da Vila Verônica gostava de mim desde o tempo em que eu organizava clube de jovens e futebol aos domingos. Brabo diz que virei camisolão ou me converti. "Virou crente"? pergunta Ariovaldo.
Vou responder a carta de Ariovaldo. Afinal,não consigo esquecer uma frase do seu pai Vicencio: "Ariovaldo, passa prá dentro que seu bico já está torto". A saudade me diz que não era só o bico de Ariovaldo que estava torto de tanto beber umas e outras e combater injustiças socais. A saudade me diz que Ariovaldo ou brabo somos todos nós, trabalhadores dessa imensa pátria brasileira ainda com tantas desigualdades sociais.
Autor: Walter Teófilo Rocha Garrocho(Téo Garrocho)- Texto dedicado aos meus amigos de infância e juventude da inesquecível Vila Verônica em Teófilo Otoni-MG. Em 03/11/2012
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