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segunda-feira, 2 de setembro de 2013

ESTÓRIAS DE ENGENHEIRO SCHNOOR

Joaquim "Português" de português só tinha o apelido. Viúvo, Joaquim passou a viver maritalmente ou juntado com Ana, uma moça prendada que veio de uma região rural conhecida por Jabuti. Joaquim vivia bem com Dona Fiota até que a mesma foi acometida por uma doença que a deixou em pele e osso. Joaquim fez de tudo para curar Fiota, mas não teve jeito. Segundo exames médicos, Fiota tinha câncer e fatalmente morreria. Questão de tempo e foi o que acabou acontecendo. Após um longo tempo sem companhia de mulher, Joaquim gostou de Ana que era bem mais nova e deu no que deu.
Joaquim, ainda assim, sentia saudade de Fiota. À noitinha ou "na boquinha da noite" como era costume dizer na região, Joaquim tinha o costume de sentar na soleira da porta de sua casa e ficava ali matutando sobre a vida, baforando seu inseparável cigarrinho de palha ao mesmo tempo em que alisava a cabeça e a barba do bode.
Sim, do bode Picolé  que há mais de 20 anos acompanhava Joaquim até mesmo na missa dominical que acontecia de mês em mês na pequena igrejinha de Nossa Senhora do Carmo da pacata cidadezinha de Girassol, encravada nas montanhas do Vale do Jequitinhonha. A chegada do velho e bondoso padre Curió era saudada com tiros de rojão principalmente por Tiãozinho, uma espécie de líder comunitário que servia a todos sem distinção e muito assediado por políticos da região.
Ainda que o bode Picolé fosse manso, sua entrada no recinto da igreja era proibida. " Onde já se viu um bode catinguento entrar na casa de Deus?, fuxicava a beata fervorosa Clotilde nos ouvidos de Sinhazinha, sua companheira de recolhimento de dízimos e arrumação da "casa de Deus". Assim, Joaquim, preocupado com a segurança do bode Picolé e chateado com as más línguas, amarrava seu bode junto aos cavalos, jumentos e éguas que ficavam do lado de fora e ao passar perto das beatas dizia em voz baixa ao pé do ouvido delas: "Prefiro a catinga do meu bode que sentir o bafo da discórdia da língua de vocês que "num tem o que fazê".
" Essa questão de bode é antiga pelos lados da igreja. Tem um povoado aqui por perto que deixa a igrejinha aberta e entra mais ou menos uns 30 bodes e alguns dão trabalho dos diabo para sair", afirmava padre Curió que não queria dar palpite sobre o bode picolé. Padre Curió preferia ficar em cima do muro, tendo em vista que Joaquim sempre levava algum agrado para ele e ajudava na manutenção da igrejinha de fé. Sobrava então para Zezinho de Lica, um aprendiz de coroinha que ficava de butuca vigiando tudo e avisava padre Curió quando Joaquim e o bode Picolé chegavam. Assim, dava tempo de padre Curió bater em retirada para a sacristia no intuito de vestir a farda, ou seja, a batina. Para a consciência do bondoso padre não era o bode que perturbava e sim a língua das beatas espalhando discórdia no seio dos doutrinados da fé católica. 
Zezinho de Lica, alem de ajudar padre Curió, ajudava também a olhar os animais. Padre Curió mandou fincar dois mourões com pau atravessado para as pessoas amarrarem os animais. Pelo "estacionamento" improvisado, o bondoso padre não cobrava nada, mas, Zezinho de Lica, sempre ganhava alguns trocados pela vigilância e dizia sempre: "Esses bicho num dá trabaio. O trabaio é que vez ou outra um cavalo se assanha com as égua e as vergonha cresce. As muié num pode nem olhá, senão assusta. Até o bode picolé fede mais. Deve ser pros cavalos num aproximar dele, né?"
Quando a missa terminava, era uma festa na porta da igrejinha. Compadre cumprimenta compadre que tá de olho na comadre, as mocinhas "tudo doidinha" para arrumar namorado, cavalo ficava mais assanhado e o pobre  solitário bode Picolé se espremia de um lado para outro desviando "das vergonhas" que cresciam de um lado e de outro. "E  põe vergonha nisso", gritava Zezinho de Lica morrendo de rir da situação que nem o bondoso padre Curió. "escondido atrás do muro" queria ver.
Joaquim afasta um cavalo daqui, outro dali e puxa seu bode que já estava num desespero dos diabo. Dona Ana que vê tudo e finge que não vê para não desagradar o amado, mete a mão entre os belos seios e puxa um trocado para Zezinho de Lica que ainda tem um tempinho para dizer bem baixinho no ouvido de Dona Ana: " Oia, Dona Ana, esse bode velho tá precisando de uma bodinha nova". Pelo visto, Dona Ana vai se arrumar mais e ficar mais bonita para Joaquim. Ah! se vai...


Autor: Walter Teófilo Rocha Garrocho- Texto dedicado ao meu justo e bondoso amigo Antonio Coelho, o popular Batata do Distrito de Engenheiro Schnoor- Araçuaí-MG- em 02/09/2013, Barbacena-MG.

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