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sexta-feira, 4 de outubro de 2013

HISTÓRIAS DE TEÓFILO OTONI

Voltei a cutucar minhas papeladas velhas que guardo num velho baú. Ali tem até um diploma original de sócio benemérito outorgado ao meu pai pelo América Futebol Clube de Teófilo Otoni no ano de 1960, ou seja, há 53 anos atrás. Penso que pode ser uma relíquia para futuro museu da história de Teófilo Otoni. Interessante também é uma carteira de motorista do meu falecido avô Teófilo Rocha e expedida em Blumenau no Estado de Santa Catarina. A referida carteira, pasmem, tem o retrato do meu avô com terno, gravata e chapéu.
Então, cutucando daqui e dali, encontrei mais uns escritos da minha amada prostituta Lora que tinha a mania de escrever tudo que ela viveu e pensava sobre a vida. Ainda bem que guardei aquelas papeladas. Eu tinha certeza que um dia eu iria publicá-las em algum lugar. Ainda que amarelados pelo tempo, os escritos com ajuda de uma velha lupa são visíveis para reprodução.
Lora começa dizendo: "Meu único filho morreu assassinado com 6 tiros. Ninguém ficou sabendo quem atirou e matou meu filho. O assassino estava na garupa de uma moto. Meu filho foi metralhado em plena via pública e tinha apenas 16 anos. Sinto que perdi um pedaço de mim. Fiquei mais revoltada quando escutei alguém dizer: " Mataram foi mais um marginal ". "Penso que se fosse o filho de um grandão dessa sociedade podre, eles já teriam descoberto quem matou. Aqui neste mundo, principalmente no Brasil, o poder financeiro e social falam mais alto".
" Aqui no morro já teve muita menina bonita. A menina para casar tinha que ser virgem. Segundo minha avó, a moça tinha que ser pura que nem Nossa Senhora. Se a moça quebrava o cabaço ou a virgindade, ela era considerada "perdida" e o pai expulsava de casa. A moça então virava rapariga e tinha que, na maioria das vezes, se prostituir na zona boêmia e transar com tudo quanto é homem que aparecia, pagando para as cafetinas da zona do Chico Sá. Pelo amor de Deus, mulher já sofreu e sofre muito desde a época de Adão quando Eva transou com um único homem e pegou fama de traiçoeira. Eva, para mim, foi uma santa que só teve um homem. Conheci algumas mulheres que transavam com muitos homens. Ajudavam nos trabalhos sociais, frequentavam os primeiros bancos das igrejas e ainda assim com suas vidas mascaradas eram respeitadas e elogiadas pela hipócrita sociedade. Minha avó dizia que tudo não passava de " lavagem dos pecados"
" Aqui tem muita puta em segredo. De dia é dona de casa e de noite sai para dar o rabo nas quebradas da noite. Não me engana ver muita puritana ensinando moral para as pessoas do morro e da cidade. Beijam medalhas e crucifixos com a mesma cara lambida que beijam outras coisas sujas. Eu lavo e passo roupa, faço biscates de todo tipo e assumo sem vergonha que dou o rabo, tanto faz de dia ou de noite. Assim, não preciso da tal "Lavagem dos pecados", segundo dizia minha avó.
" Eu nunca soube o que era virgindade. Nunca me ensinaram. Meus pais não tiveram oportunidade de estudar. Viviam de meieiros na fazenda do patrão. Sei que Maria, a Nossa Senhora, teve um filho de nome Jesus e era chamada de Maria Imaculada, a virgem santa. Desde que transei com o filho da patrão pela primeira vez, não parei de fazer sexo. Ninguém nunca me falou de doença. Dizem que tem uma tal de AIDS que mata. Nem sei o que é isso".
" A única coisa que para mim mata é a fome. Sei porque já passei muita fome no Vale do Jequitinhonha e não quero morrer de fome. Se me derem dinheiro, eu faço sexo com qualquer um e assim penso que posso matar minha fome. Um amigo meu falou que um tal Betinho disse que " A fome não espera" e eu não consigo entender até hoje como a "burocracia" trava tanto alimento nos estoques do governo  com tanta gente precisando. Até para os Índios, que no início, eram donos de tudo quanto é terra nesta pátria".
" Outro dia apareceu um bacana da alta sociedade aqui pelo morro. Ela procurava uma mocinha para trabalhar em casa de família na capital. A filha da vizinha, uma pretinha educada, queria muito ir para a capital. Só que o tal bacana não quis. Pelo visto ele só queria mocinha bonita e branca. Na verdade, o negro  ainda não tem muita oportunidade e, infelizmente no Brasil, ainda sofre muita discriminação com preconceito em relação á cor. Penso que haverá um dia em que tudo isto vai acabar. Afinal, Deus é branco ou preto?" 
Breve, muito breve, vou cutucar meu velho baú e procurar mais escritos de Lora, a prostituta politizada de Teófilo Otoni. Um amigo meu "meio doido" aqui de Barbacena, falou que tenho que tomar cuidado com as traças. Elas, assim como muitos seres humanos, não gostam de histórias verdadeiras. Preferem ficar escondidas no escuro da hipocrisia ou em cima dos muros esperando um "toma lá e dá cá".

Autor:Walter Teófilo Rocha Garrocho(Téo Garrocho)- Texto dedicado à ex. Prefeita de Teófilo Otoni, a transparente e honesta Professora Maria José Haueisen. Minha amiga e ex. Professora em Teófilo Otoni. Texto escrito em 04/10/2013. Barbacena-MG.

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